vieiracalado-poesia.blogspot.com
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sábado, 30 de abril de 2016
domingo, 24 de abril de 2016
PROCURO UM LUGAR
Procuro um lugar
nas margens do campo aberto,
um lugar para abrir
a voz das minhas interrogações
sentenciadas ao silêncio
das sentenças imperativas -
a minha desgastada busca
pelas estradas mudas
onde se busca o fim.
Não o encontro,
embora saiba que a fronteira
é vasta,
vastas as margens dos lugares
onde é possível
sonhar a aurora,
no abismo
de encontrar um caminho
de plenitude
no meio da bruma.
inédito
quinta-feira, 14 de abril de 2016
Novelo de Pó
Não vou dizer-te os meus
pensamentos íntimos
não quero convencer-te do que
é inútil e vão
para a história impreterível
das eras,
o redundante levado pelo fio
dos séculos
direito a um céu velho de
estrelas
porque o meu tempo é o que
corre nas minhas veias
e só a mim pertence,
porque é apenas
infinitivamente meu
o novelo de pó que a areia
reorganiza
na geografia dum deserto,
a harmonia própria do meu
próprio deserto.
quinta-feira, 31 de março de 2016
UM DIA
Um
dia acende-se o fulgor do palco,
cai
o pano sobre o pó.
Evaporam
as palavras de teus olhos.
Um
pássaro boceja à beira do tempo.
Depois,
não
há antes nem depois.
Apenas
um silêncio,
um
perfume ecoando sobre o vale,
uma
folha distraída levada pelo rio.
segunda-feira, 21 de março de 2016
CHEIRAR O PÓ
A redescoberta que é ver o pó, cheirar o pó,
cheirar a pó. É um rumor inerte, um retrato
tangível de outras memórias perfurantes,
um vazio entre azuis e baços no chão da terra
gritando segredos abatidos ao silêncio ileso.
cheirar a pó. É um rumor inerte, um retrato
tangível de outras memórias perfurantes,
um vazio entre azuis e baços no chão da terra
gritando segredos abatidos ao silêncio ileso.
Praticar a ciência do pó é viajar pelos gelos
da montanha, um texto insondável de signos
sobre a água, reminiscência doutras águas
de apenas a cognição nua, virgem, das fontes
da montanha, um texto insondável de signos
sobre a água, reminiscência doutras águas
de apenas a cognição nua, virgem, das fontes
é desvendar a erosão, o murmúrio de colunas
gregas, efémeras, a inocente exaltação das aves
assim que o sol reacende a festa inadiável
gregas, efémeras, a inocente exaltação das aves
assim que o sol reacende a festa inadiável
e contemplar uma indústria sem nome e sem data,
sem prólogo, divina, puríssima, demoníaca.
sem prólogo, divina, puríssima, demoníaca.
segunda-feira, 14 de março de 2016
É VIOLENTA A BRISA
É violenta a brisa pela tardes de outono,
uma angústia infinita como um túmulo
que sopra sobre um desespero sereno.
E longa é a distância onde soa a claridade,
porque remoto é o recanto do cantar
tranquilo, as noites longínquas do sonho.
quarta-feira, 9 de março de 2016
O ciclo da água
Onde o corpo percorremos feito de água.
Onde o corpo percorremos percorremos
o ciclo da água.
Onde o instante desvendamos desvendamos
o gesto
pelas mãos.
Possível
– feito
de água –
mas possível.
domingo, 28 de fevereiro de 2016
Cidade anónima
Chego a esta cidade
despido de emoções
as mãos vazias
o olhar vago, sem referências.
Trago apenas uma pequena auréola
de luz
a enfeitar o meu cabelo
pela desobediência aos ritmos
os cinzentos que leio nos ares.
Corpos estranhos desenham-se
na nudez das minhas veias
como o silêncio das águas
dum lago a rasar o azul
É tarde para situar-me
na amálgama das ruas
Só me resta uma nesga de sol
antes da noite que soa.
segunda-feira, 8 de fevereiro de 2016
CELEBRAR A TERRA
Celebrar
a terra que acende os horizontes, a persistente luz
das
estrelas, e me ensina a alegria chã das aves diligentes,
a
metamorfose dos insectos sobrevoando os vales do tempo.
Como
não hei de venerar a ostentação dos seus véus brancos
quando
caminham longe, permitido o logro, os festejos do sol,
alheios
à nudez dos ares, a mão que ateou a viuvez do tempo?
Celebrar
os jogos lascivos do vento abrasando vultos voláteis
de
árvores despidas, esculpidas na nitidez das tardes paradas,
ignorantes
de que nas cinzas é possível ler o poder das cinzas,
a
comovente singularidade de serenos crepúsculos, quando
já
outros partiram rumo ao apaziguamento, num barco de luz
livre,
escrevendo o seu nome numa flor de lótus, à beira Nilo.
E por
fim celebrar as vestes heróicas, a cada manhã revelada,
do
modesto ofício duma flor enfeitiçada sobre o rio que passa,
dum
pássaro madrugador iludindo o enigma plural da noite.
Festejar
a sua inocência, o incêndio imperfeito das sombras
que
rasam os seus destinos, numa desordem programada,
para
que prossiga o festim vagaroso, prosaico, das estrelas.
em "TERRACHÃ", ed. AJEA, 2004
sábado, 30 de janeiro de 2016
DIAS TRANSPARENTES
Nestes dias de
transparências violentadas
sonho a ardência
duma árvore estóica
testemunhando os
ludíbrios da paisagem,
um rio que
simplesmente prossegue
e se disfarça em
devaneios de águas claras
no rigor dos
invernos que conhece.
Subo do meu frio
por escadas verticais,
um perfil
amargurado de vozes interiores
que me trazem às
franjas da realidade,
os alicerces da
essência dos objectos,
onde apenas
vislumbro os excessos da luz
as cinzas ou o fogo
de vulcões extintos.
Contemplo, nas
fronteiras do alvoroço,
os murmúrios de
antigos violoncelos
sussurrando o
desígnio das águas leves
fustigando o
granito das profundas fendas
da
terra, num exercício demolidor.
Mas
nada sei dos exercícios de barro,
apenas
reconheço o ar circundante
que
prossegue dando frescura às vigílias,
na
lassitude serena de entender a bruma
a
descer sobre a superfície das origens.
Por
isso apenas me atenho às evidências
do
pólen esvoaçando ao sabor do vento,
a
pura sedução das vertentes da luz
o
mecanismo rigoroso dum grão de trigo.
in "Transparências", 1999quarta-feira, 30 de dezembro de 2015
ESTAS RUAS
Estas ruas são um enredo
de caminhos e de enredos.
Perpassam sobre as sombras da tarde
e tarde desvendam o esmaecer
do fulgor dos dias.
Presas ao lugar
dão lugar à indiferença
como um bocejo rigoroso.
Acendem o desencanto
e escrevem os meus versos
no verso duma folha morta.
sábado, 19 de dezembro de 2015
Uma casa constrói-se ao lado dum caminho
Uma
casa constrói-se ao lado dum caminho,
a
respiração contida, a luz adequada à festa
duma
porta entreaberta, grave, mas vigilante,
na
virginal sedução por aromas encobertos.
Para
sustentá-la em seus símbolos de fogo
e
seus muros de imponderável leveza,
iludem-se
os barros no plasma dos sonhos,
o
tecto lavra-se para as duradoiras chuvas
em
cerimónia primitiva ritual de origens.
Servem-se
as ervas em remotas narrativas
de
saberes esquecidos, vividos nas cinzas
do
tempo breve que preencheu a claridade.
E
para a necessária tolerância das ruínas
a
incansável circulação dos magmas, o frio,
ignoram-se
os desvios dum coração audaz
porque
a casa é o lugar exacto dos ruídos
a
respiração das águas que caiem devagar
desconhecendo
o pó, os átomos do delírio.
em "CAUSAS DE HABITUAÇÃO", a publicar
segunda-feira, 7 de dezembro de 2015
NU TEMPO
X
"A nossa consciência é o próprio
tempo!"
Henry Bergson
Somos,
pois,
apenas
personagens do exercício de passar
pelo
espaço, que julgamos ser o nosso tempo,
um
poema – talvez um poema… –,
ou
um simples texto ausente de sintaxe ou nexo,
escritos
nos interstícios do vento!
Porque
eles coabitam nos átomos do ar,
como
nós em outrem coabitámos
desde
antes de sermos nós,
sem
conhecer as fronteiras do contínuo futuro
no
seu espaço/tempo, sem era e cem limites
que
num abraço longínquo escoa os seus limites,
numa
ampulheta vertical sobre a cabeça.
Porém,
és tu que dá corpo e dependência
à
tua sede de utopias e delírios,
como
numa emoção estética
somos
nós quem dá vida a um quadro intemporal ‒
o
prémio de entender a passagem ímpar dos corpos
pelo
abstrato fruto da inquietação.
(…)
Pág 67 do poema "Nu Tempo", a publicar.
sábado, 28 de novembro de 2015
Façamos hoje o mesmo gesto
'
Façamos hoje o mesmo
gesto delicado
dos nossos avós
em memória dos
princípios que regem
o propósito antigo
de plantar uma árvore
onde havia outra árvore
no chão que persiste
o projecto lhano do
destino
de ir substituindo
gerações por outras gerações
sobre a terra.
Façamos esse mesmo
gesto delicado
em memória dos nossos
avós
e do seu propósito
antigo de reger-se
por processos que
persistiram desde os antigos
que plantavam árvores
para a ventura
de ver a terra coberta de
flores e seus frutos
para seus filhos
filhos de seus gestos
antigos dedicados
de ir plantando árvores
sobre a terra.
segunda-feira, 9 de novembro de 2015
Sou um tresloucado
Sou um tresloucado à procura de sossego,
um pária errante em cata duma pátria
que me traga no sossego a plenitude,
a harmonia própria duma pátria
longe de vulcões de pântanos e de lama,
comércio de almas e valores corrompidos,
longe da vacuidade da vanglória
e mais longe ainda do atropelo à dignidade,
mesmo dos que não sentem o atropelo
por desgraça de não saber ou não o querer,
tresloucados como eu vivendo a vida,
esta vida que não quero mas não desdenho
que a vida é fardo leve de quem tem
o mal de amar sem perda ou recompensa.
o mal de amar sem perda ou recompensa.
quinta-feira, 5 de novembro de 2015
NAQUELA NOITE
Naquela
noite sonhei que sonhava.
Era
dia.
No
meu sonho estavas tu alegre nem um pássaro
subindo
no meio duma fresta de sol,
em
inverno rigoroso.
Eu
sonhava e dizia-te sonhei contigo,
estavas
tu a sorrir sentada no chão,
enquanto
a chuva caía sobre uma árvore despida de folhas,
meditativa.
Era
uma sensação plena de ternura
pelos
teus grandes olhos azuis alucinados,
ignorante
da vacuidade dum extenso fogo
que
eu já vi nos despenhadeiros
por
onde andam os répteis absurdos,
nas
linhas verticais dum desejo.
O
teu corpo reclinava-se,
voava
em cima dum enorme bloco de gelo
que
transfigurava tudo no cinzento dum pombo,
na
noite plúmbea do mar.
Eras
tu que vigiavas uma fábrica de beijos,
homens
e mulheres de estranhos capitéis
para
se protegerem da geada
ou
talvez da antiga ciência do deslumbramento.
Eu
era apenas uma sombra.
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