Naquela
noite fazia frio fazia pena
ver
almas despedaçadas deitadas corpos entrouxados
dispersos
nas calçadas luzidias do passeio das ruas.
Caía
uma névoa fina que simulava chuva punhais
de
raiva e resignação ou antes uma levada de mágoa
de
murmúrios sem data sem fumo sem restos de cio
perdidos
num mar de pedras nas calçadas da rua.
Era
uma noite de claustros tambores rufando clamando
os
clamores da vida a náusea descrente na boca sofrida
o
granito fundido já duro das lutas perdidas
pisado
nos ossos nos ombros nos olhos que olham
as
coisas de fora nas coisas de dentro
e
as noites nos dias e os búzios na praia sem vento
soprando
as pedras do passeio da rua.
Doía
a quem doía não fora a noite uma noite
de
aprazimento em todas as aldeias da cidade
tempo
de alegrias acepipes farturas alvarinho
em
casas abastadas sobranceiras aos passeios da rua ‒
o
mais vago grave desígnio dum oráculo de plenitude
na
inocência das crianças nas crenças na sentença
dos
mecanismos que levam ao enternecimento
por
ver a chuva a cair sobre corpos alheios
prostrados
enrodilhados no manto do passeio das ruas.